terça-feira, 21 de julho de 2009

Ações do documento Projeto da Embrapa estuda formas de aproveitamento do ouricuri por agricultores familiares

Palmeira é típica da Bahia

Com 82 anos, seu Rosentino Prudêncio dos Santos sempre morou em uma “tirinha de terra” no lugarejo de Pilões, município de Jacobina – BA. Planta um “pouquinho” de feijão, de milho, de mandioca. Camisa puída, facão na cintura, ele aponta com as mãos calejadas de onde costuma tirar a renda para comprar “café, açúcar”: os muitos pés de licuri que se espalham por sua pequena propriedade.

Nos tempos de inverno (janeiro a abril), e mais ainda quando as trovoadas anunciam a permanência das chuvas por mais tempo, ele sai à cata de cachos dessa palmeira para vender, quase sempre, a atravessadores que percorrem ávidos a região para comprar a coleta dos agricultores.

Os cachos que coleta, cheios de coquinhos, Seu Rosentino espalha em parte do terreiro da sua casa e deixa secar ao sol. É o único pré-beneficiamento que faz antes de quebrá-los e entregar no ponto de venda por preço que ele diz ser muito fraco (entre R$ 0,60 e R$ 1,00, o quilograma). Daí pra frente, ele não sabe exatamente o que é feito dos coquinhos, mas há uns 30 anos, “quando o povo pegou a vender”, que “dizem que é para fazer óleo”.

Mercado - O licuri ou ouricuri é uma palmeira tipicamente baiana que chega a alcançar 6 metros de altura. Em grandes áreas do semiárido do estado, inclusive nas caatingas secas e pedregosas, plantas da espécie dominam a paisagem na vegetação nativa. Nas roças, como a de seu Rosentino, é comum o consórcio dessa palmeira e culturas de subsistência: feijão, milho, mandioca e forrageiras.

“Antigamente”, o processamento caseiro da amêndoa do coquinho do licuri abastecia as famílias de tempero, sabão, óleo para alisar cabelo e cicatrizar cortes, revela o agricultor. Também, de muito tempo, se enfiam os coquinhos num cordão, à semelhança de um colar, para ser vendido em feiras livres.

A movimentação dos atravessadores pelos territórios baianos da região do Sisal, que abrange 20 municípios, e do Piemonte do Norte do Itapicuru, formado por 9 municípios, revelam que está sendo formado um mercado em torno de co-produtos da palmeira em escala comercial e até industrial, que organizações não governamentais e instituições públicas de pesquisa e desenvolvimento buscam estimular iniciativas e empreendimentos que gerem renda e emprego para um universo de agricultores como o Seu Rosentino.

100% – Uma dessas iniciativas é o projeto “Estratégias de aproveitamento dos co-produtos do coco ouricuri na alimentação humana e animal”, coordenado pelo engenheiro agrônomo José Barbosa dos Anjos, pesquisador da Embrapa Semi-Árido, e financiado pelo Instituto de Desenvolvimento da Região do Sisal (IDRSisal). Já em execução, são avaliadas técnicas de pré-processamento para utilizar a palmeira na produção de alimentos, de óleo, de fonte energética, bebida, sabonetes, sabões, detergentes e picolés.

De acordo com José Barbosa, em cada parte da planta de ouricuri, há propriedades que podem ser transformadas em ingredientes comerciais capazes de gerar renda e postos de trabalho. Análises de laboratório, registraram a propriedade de quase 100% de saponificação, por isso o óleo extraído do coco de ouricuri tem destino certo: as indústrias de saboaria. Neste caso, o percentual de soda cáustica é bem menor no processamento de sabões, sabonetes e detergentes.

Outro co-produto do ouricuri é uma espécie de casca que envolve o coquinho. De consistência muito dura, esse resíduo é apontado pelo pesquisador da Embrapa como um combustível renovável, que pode ser incluído na matriz energética da região. Com baixo teor de enxofre, a adoção desse material, para alimentar fornos de cerâmicas ou fogões de residências, reduz a pressão pelo corte da vegetação nativa para produção de lenha, como também causa pouco impacto sobre o efeito ao meio ambiente, por se tratar de uma energia limpa e de fonte renovável. Segundo ele, mais ou menos 20 kg de carvão de ouricuri geram a mesma energia de um botijão de 13 kg de GLP (gás liquefeito de petróleo).

Indústria – Para Barbosa, o ouricuri precisa ter uma exploração racional e ser encarada pelos agricultores familiares do semiárido baiano como uma cultura perene e rentável. O projeto que coordena tem a pretensão de introduzir técnicas adaptadas à exploração dos co-produtos da palmeira em nível de propriedades ou em comunidades urbanas.

Em Caldeirão Grande, um dos municípios que formam o Território do Piemonte do Norte do Itapicuru, a instalação no ano de 2008 de uma indústria no âmbito de um programa da Superintendência da Indústria e Comércio do Governo da Bahia tem dado nova dinâmica ao mercado de ouricuri na região. Inicialmente cedida a uma associação de agricultores para exploração, acabou sendo assumida pela Indústria de Extração de Óleo Vegetal (Inovec). Do processamento inicial de 600 kg/semana, já chega a esmagar, no período de safra 2000-2500 kg/ semana.

Kedna Samira Bezerra Sobreira, Gerente Administrativa da Inovec, considera pouco. Ela explica que trabalha com a meta de chegar a esmagar entre 1000 kg e 2000 kg por dia da amêndoa do ouricuri. O mercado, que se restringia a clientes fabricantes de material de limpeza (sabão, detergente e desinfetante) em municípios vizinhos (Morro do Chapéu e Euclides da Cunha), tem perspectivas de expansão para lugares tão distantes quanto Lauro de Freitas, Vitória da Conquista e Feira de Santana.

Potencial – As vantagens da industrialização são percebidas pelo genro de Seu Rosentino, Maurício Almeida dos Santos. Para ele, viabilizar o processamento da amêndoa pelos próprios agricultores é maneira que vê para conseguirem melhores preços na venda do ouricuri. Da forma como acontece atualmente, a comercialização a granel (licuri inteiro), ao preço de R$ 0,10/Kg, gera uma pequena renda que apenas compra poucos itens da cesta básica das famílias, explica.

Assistente Social, com atuação nos municípios de Filadélfia e Pindobaçu, Solange Santos Marinho considera que a instalação e o funcionamento regular de uma indústria são o modo mais acertado de ampliar a renda das famílias de agricultores e de impulsionar o desenvolvimento econômico de municípios, com base em um recurso abundante e local. Num estudo feito com o objetivo de dimensionar a densidade da palmeira de ouricuri na área territorial de Caldeirão Grande, chegou -se à estimativa da ocorrência de uma população de plantas de mais de 15 milhões de pés, com uma produção média anual estimada em 12 kg de amêndoa por palmeira.

A industrialização também é uma forma de aumentar a produtividade do trabalho dos agricultores. O rendimento da extração manual de coco ouricuri é muito baixo: em torno de 5 a 7 kg de amêndoa por dia. O equipamento desenvolvido para quebra do coco, em operação na Inovec, produz 600 kg de coquinho, por hora.

O ouricuri precisa passar a ser explorado em bases mais racionais. Algumas questões tecnológicas ainda precisam ser acertadas para aprimorar o desenvolvimento de novos co-produtos. Contudo, o planejamento de melhores estratégias de aproveitamento do coco e de seus co-produtos deve levar a atividade a evoluir de uma forma artesanal, para se consolidar em negócios rentáveis para muitas famílias do sertão baiano, afirma José Barbosa.


Contatos:
José Barbosa dos Anjos – pesquisador;
jbanjos@cpatsa.embrapa.br
Marcelino Ribeiro – jornalista;
marcelrn@cpatsa.embrapa.br
Embrapa Semi-Árido – 87 3862 1711



2 comentários:

Nattu disse...

Olá,

Gostaria de te enviar um texto sobre a Arara_Azul-de-Lear, espécie exclusiva do sertão baiano, e alguns aspectos do trabalho de pesquisa que estou desenvolvendo na região de Euclides da Cunha - BA. Se quiser te mando umas fotos também.

Suely Salgueiro Chacon disse...

Olá Simone!
Gostaria muito de receber o texto e as fotos, e também conhecer sua pesquisa. Publicarei as informações com prazer. Quem sabe encontramos aspectos em comum nos nossos trabalhos.
Abraço!