Todo esse momento está carregado de um forte simbolismo que não pode ser ignorado. Pelo contrário, antes de criticarmos um ou outro gesto exagerado do novo Presidente durante os dias de festejo, ou duvidar de sua capacidade de lidar com os enormes desafios que o aguardam, acredito que vale a pena fazer uma leitura dos seus gestos até aqui e, especialmente, dos gestos do povo em todo o mundo, não apenas nos Estados Unidos, relacionados com esse momento.
Aproveito então esse espaço no nosso Blog para comentar algumas imagens e palavras que ficaram mais marcantes para mim. Vale como registro para que possamos avaliar no futuro se toda a esperança de agora irá resultar em uma real transformação. Para mim o entendimento das diversas crises que vivemos passa pela análise da forma de se relacionar da homem com os seus semelhantes e com a natureza. Considerando isso, creio que a posse como presidente desse homem que parece tão maravilhosamente diferente é sim um marco na história da humanidade.
Quer queiramos ou não, ele comandará o país que ainda é o mais poderoso, e que pode definir nosso destino. Não dá para ignorar isso, ou fazer de conta que não nos afeta. Proponho assim que possamos olhar para esse momento a partir da perspectiva da mudança, e da responsabilidade. E possamos, ao refletir sobre ela, dar mais um passo para compreendermos como cada um pode ser capaz, em seu espaço, de promover transformações reais na condição de vida de nossos semelhantes e de nosso Planeta. Vou dividir por tópicos minhas observações (coisa de professora...), e tentarei não me alongar muito. Acrescento umas imagens que falam por si.
Ele não quer ser unanimidade, ele não está negando o modo de vida de seu povo, e não pretende desistir de seus valores e aceitar simplesmente o que não acha correto. Mas ele assume a responsabilidade de ouvir, de dialogar, de buscar novos caminhos que não passem por armas e guerras.
Resta saber se ele conseguirá ser hábil o suficiente para aproveitar o voto de confiança que até os inimigos declarados lhe dão nesse momento.
Os excessos da posse...
Esperança, orgulho, auto-estima renovada
E sonhar é o que essas senhoras da fotografia abaixo podem se permitir nesse momento. Não há imagem mais representativa do quanto se espera de Obama nesse momento, e do quanto a sua posse representa a renovação da esperança, do orgulho de cada cidadão, não apenas de seu país, mas de todo um mundo que sofre com tantos conflitos e tantas dores vindas da incompreensão. O orgulho de ser humano! Antes de ser negro, branco, americano, africano ou brasileiro, somos seres humanos! E pelo menos nesse momento de festa e esperança temos orgulhos disso, temos nossa auto-estima renovada, temos a chance de nos vermos, nos encontrarmos.
Mary K. Jones (à direita), 78 anos, e Ella Crawford, 73, assistem a cerimônia de posse de Obama (Foto de Paul Sancya/AP - UOL noticias)
A nova imagem do homem-instituição, que não se envergonha de demonstrar suas origens, seus sentimentos, que é jovem e ainda sorrir...
A história de vida de Obama, e seus gestos não apenas durante a posse, mas em toda a sua vida política, denotam que este não é um homem comum. No meu entender é a coragem de assumir quem é, com todas as contradições inerentes a qualquer ser humano e, em especial a um homem que traz em si a síntese de uma mistura de raças impresionante.
Um coisa me chamou atenção: seu comportamento com a mulher, Michelle. Ele não tem o menor pudor de demonstrar quanto a ama. E esse amor se reflete no sorriso fácil de suas filhas. É uma relação de respeito. E isso não se inventa da noite para o dia.
Buscando mais sobre suas origens, a figura de sua mãe se ressalta. A mãe de Obama, Stanley Ann Dunham Soetoro, que morreu em 1995, parece ser um dos principais pilares do político que surpreendeu o mundo ao se tornar o 44o. Presidente dos Estados Unidos.
Mulher de perfil pouco convencional, criou o filho sozinha desde que ele tinha 2 anos - e foi, segundo o jornal O New York Times de 14-03-08, quem mais formou a personalidade de Obama. No Havai, em 1960, Stanley Ann casou-se com um colega de faculdade, Barack Obama, o 1o estudante africano da Universidade. Naquela época os casamentos interraciais eram raros. Os pais de Obama se separam logo, pois seu pai optou pelo doutorado em Economia, e depois retornou ao Quenia. A mãe, mais uma vez quebrou os padrões e casou-se pela 2a vez com um estudante da Indonesia. Mudou-se para o país do marido com o filho pequeno, trabalhou lá para a Ford Foundation, foi consultora da Agency for International Development, liderou iniciativas de trabalho feminino e ajudou a levar microcredito para os pobres. "Muitos dos amigos dela vêem o seu legado em Obama", diz o NYT, "em sua auto-confiança e motivação, em sua capacidade de construir ligações entre mundos separados e por parecer estar à vontade ao lado de mulheres fortes".
Na foto acima vê-se Obama ainda menino no colo da mãe.
O pai, que morreu em 1982, Barack Hussein Obama.A mãe de Obama durante seu trabalho na Indonésia.
A família de Obama na Inodésia, a mãe, a irmã, e o padrasto.
Maya Soetoro (no alto, à direita), irmã de Obama, filha do segundo casamento da mãe. E as filhas do novo presidente, Malia (à esquerda) e Sasha, acompanham a cerimônia de posse (Jae C. Hong/AP Photo)
Barack beija o rosto da mulher Michelle (Timothy A. Clary/AFP)
Obama e Michelle saem da limusine e fazem a pé parte do trajeto do Capitólio até a Casa Branca, na avenida Pennsylvania (Foto: Jae Hong/AP)
Obama discursa ao lado da mulher Michelle: "Agora, se me dão licença, vou dançar com essa mulher que faz tudo o que eu faço, mas com saltos e de trás pra frente. Ela não está linda? É o amor da minha vida", disparou. (AFP)
Barack Obama faz o gesto havaiano chamado de "hang loose", no começo da caminhada em direção à Casa Branca (Pablo Martinez Monsivais/AP)
A realidade dura amenizada pelas cores da alegria, do inusitado fato
Crianças de Kibera, um dos bairros mais pobres de Nairóbi, no Quênia, dançam em volta de fogueira para comemorar a posse de Obama, que é filho de um queniano (Foto: Yasuyoshi Chiba/AFP - UOL Noticias)
Em Nairóbi, Quênia, bar anuncia que irá colocar uma televisão para exibir a cerimônia de posse de Obama. (Foto: Stephen Morrison/EFE - UOL Noticias)
As cores da diversidade
E é a consciência que é a diferença que nos faz seres individualmente únicos e especiais que pode mostrar a força da união de todos em torno do objetivo de promover o bem comum. Somos parte de uma só espécie! O respeito à diversidade que existe no seio dessa espécie é assim condição essencial para a mudança.
Com Obama, a diversidade se impõe a todos, mesmo aqueles que gostariam de ignorar que mesmo diferentes somos iguais.
As heranças da África, que também partilhamos no nosso Brasil, acenam para todos sem vergonha de mostrar suas cores vivas, vibrantes, cores da mudança...
Mais uma vez é a mulher, Michelle, que representa com força essas cores. O vestido, o sorriso, a leveza e a segurança de uma pessoa que venceu preconceitos.
São também os parentes da África, a avó postiça com seu turbante e o sorrisão tranqüilo. Os guerreiros Massai que se divertem com o assédio dos turistas no Kênia...
E são ainda os rapazes brancos que se beijam sem receio no meio da multidão que comemora a posse de Obama...
Euforia Coletiva
Toda festa é simbólica. É um ritual. E nessa festa em especial, a sensação de euforia é coletiva. Todos se confraternizam ao redor do mundo. Do jeito que lhes for possível.
Até os mais excluídos querem participar desse momento. Se não tem TV vão às lojas e aproveitam as imagens nas vitrines. Se não há lojas, vale ouvir no radinho de pilha.
Seja na África ou enfrentando as temperaturas geladas de Washington, todos querem sentir que fizeram parte desse momento.
Quenianos se empolgam ao assistirem posse de Obama (Sayyid Azim/AP)
Nas fotos acima, duas imagnes da multidão em volta do espelho d'água no National Mall por conta do ''Nós somos um: celebração da abertura inaugural no Memorial de Lincoln'', em Washington. (Fotos: Carolyn Kaster/AP e Kim Ludbrook/EFE - UOL Noticias)
O peso do compromisso
E Obama, como se sentiu naqueles momentos? O peso que o cargo traz não é apenas relativo às obrigações comuns aos dirigentes de grandes nações, mas é, acima de tudo, relativo ao compromisso que esse homem assumiu publicamente de fazer a diferença.
Todos comentaram que o Presidente gaguejou ao pronunciar o juramento na cerimônia de posse. Ainda bem! Ele é humano! E é isso que faz dele alguém que pode nos ajudar a melhorar.
Ao assinar seu primeiro ato, o novo presidente deve ter sentido de forma clara o tamanho da responsabilidade que assumia naquele momento. Os olhares daqueles que o cercavam devem ter surtido um efeito devastador, pois sua expressão seguinte pareceu-me com a de um menino assustado que se viu de repente cercado por adultos que esperavam que ele começasse um show excepcional, ou coisa parecida.
O discurso
Forte e cheio de significados. Como tinha de ser. Assumindo compromissos, mas não prometendo milagres. E deixando claro que pretende dialogar. Contudo, diálogo significa disposição dos dois lados.
Para ouvir o discurso na íntegra: http://noticias.uol.com.br/ultnot/multi/assistir.jhtm?media=veja-o-discurso-de-posse-de-obama-04023072CCC15326
Poder para mudar
É relevante o apoio que o novo Presidente consegue angariar nesse primeiro momento. O antigo rival republicando ajudou a garantir que a indicação de Hillary Clinton para Secretária de Estado fosse aprovada pelo Congresso. E os dois, Obama e Hillary, têm agora a chance de fazer a mudança de fato.
Por todo o mundo, não apenas nos Estados Unidos, existem questões urgentes que precisam de solução. E a força decisória dos americanos pode ser decisiva em muitos casos.
Na foto acima uma criança anda por um centro de doação de alimentos em Chirumanzi, no Zimbábue. Cinco milhões de zimbabuanos, ou 40% da população, sobrevivem com doações de alimentos. O Banco da Reserva do Zimbábue (banco central) colocou em circulação cédulas de até 100 trilhões de dólares zimbabuanos, em um país onde a inflação fez com que a moeda local perdesse seu valor (Foto: Philimon Bulawayo/Reuters - UOL Noticias) Mais
As questões com os países islâmicos, especialmente com o Irã, estão entre as prioridades para o novo Presidente no terreno da segurança mundial. A foto acima tirada em Teerã, em frente à embaixada dos EUA, mostra uma mulher passando por um painel anti-EUA. Apesar dos protestos contra Obama no Irã, o governo desejou sorte ao novo presidente e disse esperar que Obama escolha o caminho certo nas relações com o Irã, corrigindo o passado de hostilidades. (Foto: Abedin Taherkenareh/EPA - UOL Noticias) Mais
Os conflitos internos em muitos países pobres não podem ser esquecidos. A miséria, a fome e a total falta de acesso à serviços básicos e à informação tira desses povos não só a possibilidade de se desenvolverem, mas também tira sua própria liberdade. A foto acima mostra vendedores trabalhando sob luz de velas em Porto Príncipe, no Haiti, onde o Brasil comanda as Forças de Paz da ONU. Menos de 6% dos haitianos têm eletricidade o tempo inteiro (Foto: Ariana Cubillos/AP - UOL Notícias)
Um dos pontos mais delicados no cenário mundial atual é o conflito entre Palestinos e Judeus. Longe de ser um conflito apenas religioso, é um conflito com raízes políticas profundas, e extremamente ligadas à relação entre americanos e judeus. Em seu discurso Obama não citou esse conflito, mas o mundo espera por sua atitude. Significativamente, Israel aceitou se retirar de Gaza às vesperas da posse de Obama... Na foto acima um taque do Exército israelense, que iniciou neste domingo a retirada parcial de suas tropas da Cidade de Gaza e seus arredores (foto: Amir Cohen/Reuters - UOL Notícias) Mais
A imagem acima é tão simbólica quanto tudo que aconteceu nesses últimos dias. Mostra um menino negro em Kampala, capital de Uganda. Ele participava de uma vigília, em dezembro de 2008, quando cerca de 200 crianças fizeram para que o governo impeça as ações do grupo rebelde LRA, liderado por Joseph Kony (Foto: James Akena/Reuters - UOL Notícias)
E para o Brasil e os Semiárido, qual pode ser a repercussão?
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