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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

História do Sertão - sofrimento das secas é lembrado em caminhada


almas da barragem

Caminhada da Seca reúne 5 mil fiéis

Publicado em 14 de novembro de 2011 

A caminhada em Senador Pompeu é sempre no segundo domingo de novembro. O cortejo inicia às 5 horas
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São cerca de seis quilômetros de distância. São quase duas horas até a chegada ao cemitério da barragem. Neste ano, uma das novidades foi o Cristo Crucificado à frente da procissão
FOTO: ALEX PIMENTEL

Senador Pompeu O ritual se repetiu pelo 29º ano consecutivo. Ainda era madrugada quando milhares se concentraram diante da Igreja Matriz de Nossa Senhora das Dores, no Centro de Senador Pompeu. Eram fiéis, cerca de 5 mil devotos das Almas da Barragem, a aguardar o sinal para o início do cortejo em homenagem aos retirantes da seca de 1932, dizimados no Campo de Concentração do Açude Patu, na periferia da cidade. Na maioria mulheres, muitas descalças, dispostas a pagar promessas atendidas pelas Santas Almas. Mas havia também o contexto social, representando por organizações não governamentais, e busca de justiça social e reparo histórico da tragédia humana registrada no Açude Patu.

E nesta Caminhada as novidades foram o Cristo Crucificado à frente da procissão e a despedida do padre Carlos Roberto Costa, um dos principais responsáveis pela revitalização da Caminhada da Seca. Foi a última participação dele à frente da Paróquia de Nossa Senhora das Dores. No próximo ano ele deve voltar, mas como missionário de outra freguesia. Nos últimos sete anos, além da mobilização pastoral, era ele quem guiava o rebanho humano pela sinuosa estrada do Santuário da Seca.

Pregação
A cada quilometro percorrido, uma rápida pregação em louvor das santas almas da barragem. Respeitosamente a multidão ouvia algumas passagens do o sofrimento de quem não sobreviveu no curral da fome, como o lugar também ficou conhecido. Um momento de penúria ao saberem de famílias inteiras sepultadas em covas rasas por não conseguirem vencer dois inimigos mortais, a fome e a cólera. "Mas não se foram em vão", justificava a aposentada Maria Augusta Moreira. Mesmo chegando aos 80 anos ela faz questão de participar passo-a-passo de todo o trajeto. Por conta do cansaço nas pernas, caminhada só de ida.

A explicação para a peregrinação, cada vez mais fortalecida, de acordo com o padre Roberto Costa, está no próprio povo, ao depositar suas esperanças no santo coletivo. Com o passar dos anos, os milagres estão surgindo e a fé se fortalecendo. Mas além da religiosidade é preciso refletir sobre o vergonhoso episódio do campo de concentração. Relembrá-lo a cada caminhada é alertar os governantes para que essa passagem nunca mais se repita. Esse é um dos principais propósitos da mobilização criada em 1982 pelo vigário Albino Donatti. Além da fé, a consciência e o desenvolvimento de políticas públicas para convívio com a seca e com o semiárido completam o ato.

E foi justamente o que uma das últimas sobreviventes do Campo de Concentração, Luiza Pereira Lo, relatou para cerca de cinco mil pessoas, mais uma vez, na tradicional missa campal realizada em frente ao Santuário das Almas da Barragem. Tem sido assim ao longo de quase três décadas. Primeiro foi com o padre Albino Donatti, de 1982 a 1994; em seguida, o padre João Paulo, de 1995 a 1999; depois, Frei Duarte, em 2000 e 2001. Ele foi seguido pelo padre José Marques, á frente da Caminhada da Seca até 2004, quando foi substituído pelo pároco Roberto Costa, completando este ano sua sétima participação à frente do movimento católico em louvor das Almas da Barragem.

Distância
São cerca de seis quilômetros de distância. São quase duas horas até a chegada ao cemitério da barragem. O campo santo está situado numa colina com vista para as ruínas da Vila dos Ingleses e a represa pública concluída pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs) em 1987, com capacidade para 71.829.000 m³ e atualmente com 90,5% de sua capacidade, conforme dados da Funceme. Por ironia, justamente onde milhares de flagelados morreram está principal fonte de vida e riqueza da "Terra das almas da barragem".

Além da Igreja Católica, por meio da Diocese de Iguatu, o Centro de Defesa dos Direitos Humanos Antônio Conselheiro (CDDH-AC) e o Instituto Casarão integram o grupo de mobilização da Caminha da Seca.

Alex PimentelColaborador

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Seca - Lembrar para não repetir

SENADOR POMPEU

Caminhada da Seca reúne 6 mil pessoas

15/11/2010 Clique para Ampliar
Milhares de fiéis e curiosos participam todos os anos da Caminhada da Seca. Lembram e celebram a dor e o drama vivido por milhares de sertanejos na seca de 1932
FOTOS: ALEX PIMENTEL

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Peça retrata história do Campo de Concentração da seca de 1932, em Senador Pompeu. Foi escrita pelo advogado Valdecy Alves
A cada ano, a Caminhada da Seca mobiliza mais fiéis, lembrando das santas almas da barragem

Senador Pompeu. Mais uma vez o martírio de milhares de retirantes no flagelo da seca de 1932, no Sertão de Senador Pompeu, foi relembrado na manhã de ontem. Cerca de seis mil fiéis partiram da Igreja Matriz de Nossa Senhora das Dores, no Centro desta cidade, com destino ao campo santo da barragem do Açude Patu. Ainda era madrugada quando o padre Roberto Costa anunciou o início da 28ª Caminhada da Seca. 

A maioria, vestidos de branco, pagava promessas e todos exaltavam as santas almas do povo, como ficaram conhecidas as vítimas da fome e da cólera, enterradas em covas coletivas ao lado da barragem, transformadas em milagreiras através do imaginário popular.

Como nos anos anteriores, homens se revezavam carregando na cabeça a maquete de uma cisterna de placa. Além do ato religioso, o reservatório domiciliar se transformou no símbolo da redenção do infortúnio sertanejo, a seca. Ao lado do agricultor, o padre Roberto Costa, responsável pela mobilização pastoral, guiava o rebanho humano pela sinuosa estrada do Santuário da Seca. Missionárias empunhavam faixas exaltando a caminhada e a luta do povo de Deus pela vida e cidadania. Logo atrás a multidão gritava em coro: "As almas do povo são o santo do povo!".

Enquanto o cortejo invadia a estrada sinuosa com destino ao santuário da barragem, uma das últimas sobreviventes do campo de concentração, dona Luiza Pereira Lô, aguardava diante do cemitério das Almas do Povo o início da celebração religiosa, realizada, tradicionalmente, naquele local. Apesar dos 93 anos, lúcida, não se afobava em relatar o seu testemunho sobre o sofrimento de quem não sobreviveu no curral da fome, como o lugar também ficou conhecido. "Ali, muita gente era mantida para não invadir e nem saquear as cidades", apontava ela para a represa logo abaixo. O restante do seu testemunho ela registrou para a multidão no início do culto religioso.

Acompanhado do bispo diocesano de Iguatu, dom João Costa, o pároco de Senador Pompeu convidou a sobrevivente para subir na plataforma onde a missa foi celebrada. Comovidos, muitos começaram a chorar. A costureira Maria do Socorro de Oliveira não se conteve ao ouvir o relato compassado de Dona Luiza, lembrando o sofrimento de sua família e de sua irmã nascida ali. Eles haviam caminhado mais de sete léguas, fugindo de miséria pior no Sertão dos Inhamuns. Embora pequena, entendia e sofria com eles. O pai se enterrou ali, a irmã também.

Comoção

O auxiliar de enfermagem José Nascimento, também se comoveu com as palavras da sobrevivente. "Esse foi um momento muito doloroso para centenas de famílias. Tamanha maldade é injustificável. Por tanta penúria, quem perdeu a vida de forma tão trágica só poderia se transformar em santo mesmo". Para ele, relembrar esses momentos e reforçar a certeza de que um episódio tão trágico nunca mais volte a acontecer em lugar nenhum do Mundo.

Afetado por uma grave doença quando tinha 17 anos, o agricultor Francisco de Assis Fernandes depositou suas esperanças nas almas da barragem. Ele diz ter sido milagrosamente curado após fazer uma promessa. Desde então percorre toda segunda-feira até o santuário da seca, onde acende mais de uma dezena de velas. Emocionado, diz ter sentido na própria pele a dor de quem foi tratado em condições sub-humanas ali vizinho. "Mulheres e crianças foram mortos como bichos, mesmo assim nos amparam. Somente quem é santo tem esse dom", completa.

De acordo com o padre Roberto Costa, o próprio povo depositou suas esperanças no santo coletivo. Com o passar dos anos, os milagres estão surgindo e a fé se fortalecendo. Mas além da religiosidade é preciso refletir sobre o vergonhoso episódio do campo de concentração. Relembrá-lo a cada caminhada é alertar os governantes para que essa passagem nunca mais se repita. Este ano a mobilização em torno do ato religioso iniciado em 1982 pelo vigário Albino Donatti, voltou a se fortalecer, e com ele, além da fé, a consciência e o desenvolvimento de políticas públicas para convívio com a seca e com o semiárido.

Transposição

O bispo diocesano dom João Costa ressaltou a importância do ritual místico popular para o povo nordestino. Ele não é a favor da transposição do rio São Francisco como solução para o problema da seca. Na opinião do representante da Igreja Católica, o "Velho Chico" está agonizando. Utilizá-lo para interligá-lo às bacias hídricas do semiárido é decretar sua sentença de morte. "É importante dividir com todos os recursos disponíveis e não privilegiar uns poucos. A água é um dos muitos dons de Deus. Aproveitá-la com responsabilidade é a melhor maneira de conviver com esse fenômeno da natureza", afirmou.

Vítimas

2,5 mil é o número estimado de retirantes mortos no campo de concentração do Patu, entre homens e mulheres, crianças, adultos e idosos. As vítimas são lembradas todos os anos

Saiba Mais

1932 foi o ano de grande seca no Nordeste. Em virtude desse fenômeno milhares de sertanejos, retirantes, seguiram de diversas regiões para Senador Pompeu, em busca de trabalho e comida. Para não invadirem e saquearem as cidades, foram mantidos no canteiro de obras da barragem do Açude Patu. Ficaram presos a uma vida verdadeiramente sub-humana.

Em 1982, é iniciada a romaria ao Santuário da Seca, cemitério da barragem do Patu, iniciativa do padre Albino Donatti. A ideia da Caminhada surgia em razão de reverenciar os mortos no mês de novembro, e, portanto, o segundo domingo deste mês foi escolhido pelo sacerdote para reverenciar os mortos anônimos da seca de 1932.

No ano de 1987 foi realizada uma manifestação popular de protesto em favor das comunidades do Patu, Carnaúba dos Canudos e Carnaúba dos Marianos, cujos moradores ficaram completamente isolados pelas águas do açude. O movimento foi encabeçado pela Paróquia e pelo Centro de Defesa dos Direitos Humanos Antônio Conselheiro (CCDH), sendo o Dnocs obrigado a construir estradas.

Somente no ano de 1988 são concluídas as obras do Açude Patu, quase 70 anos depois.

MAIS INFORMAÇÕES

Paróquia de Nossa Senhora das Dores
Centro - Senador Pompeu
(88) 9928.2592

SANTAS ALMAS

Encenação retrata tragédia de 1932

Grupos de teatro, após pesquisa e entrevistas com sobreviventes, encenam drama de milhares de sertanejos

Senador Pompeu. Diretamente envolvido com os movimentos sociais e culturais de sua terra natal, o advogado, poeta, cineasta e dramaturgo Valdecy Alves resolveu levar para o palco uma das passagens mais dolorosas da história de seu povo, o sofrimento de milhares de flagelados no campo de concentração da barragem do Patu. 

Após anos de pesquisas, minuciosos estudos e entrevistas com sobreviventes, ele criou um espetáculo forte, com pouco mais de uma hora de duração. Segundo o dramaturgo, o objetivo é esse mesmo, aproximar o enredo da realidade traçada pela história.

O espetáculo foi apresentado no Centro Pastoral da paróquia de Nossa Senhora das Dores na noite antecedente à Caminhada da Seca. Antes, os atores invadiram a igreja durante a celebração eucarística. A ideia era despertar no púbico católico o interesse pela encenação recriada a partir de simbologias das artes cênicas o clima austero daquela tragédia sertaneja, onde vítimas da seca, da fome e de descaso político sofreram e perderam suas vidas.

Tendo à frente da produção o promotor cultural e cineasta Fran Paulo da Silva, o elenco é formado por 25 atores da Companhia Engenheiros da Arte e do grupo Arautos do Bonfim, do Km 20. Assim como a equipe de produção, todos são voluntários. Não recebem cachê. 

Os ingressos foram vendidos a preço popular, apenas R$ 2,00. Mesmo assim, o salão ficou lotado. Quem assistiu ficou impressionado. O professor Adriano Medeiros foi um deles. Não imaginava se deparar com uma apresentação tão rica. "Os diálogos parecem cortar a carne da gente. Eu não imaginava que todos foram obrigados a vestir sacos de farinha porque as roupas estavam aos trapos".

Nas suas pesquisas Valdecy Alves constatou que o Campo de Concentração do Patu era um dos maiores do Ceará, com 16.221 flagelados. Naquele ano de 1932 haviam outros cinco no Estado: Carius, com 28.648; Buriti, no Crato, com 16 mil; Ipu, com 6.507; Quixeramobim, com 4.542 e mais dois em Fortaleza, o do Urubu e o do Matadouro Modelo, juntos somando 1,8 mil retirantes. O Campo do Patu, começou a ser construído em abril de 1932. Diariamente eram mortos 30 bois, consumiam-se 80 sacos de farinha e 40 sacos de feijão.

Senador Pompeu tinha posição privilegiada no sertão Central e foi um importante centro comercial. A estrutura era composta por vários casarões e armazéns, e o trem conseguia chegar até lá. Sendo fácil tanto transportar flagelados como provisões. Por fim, lá houve a maior quantidade de mortos. Tamanho foi o sofrimento, que as almas foram santificadas pelo imaginário popular.

Enquete 
Preservação

"O teatro é umas das mais interessantes formas de recriar qualquer momento de nossas vidas, na alegria ou na tristeza"

Valdecy Alves
Escritor da peça

"Incorporar personagens vivos na história, como estes, é com certeza uma forma de sensibilizar o público"

Elcelane de Oliveira
Atriz

ALEX PIMENTEL
COLABORADOR

MUNICÍPIOS CEARENSES (5/11/2010)

Falta de recursos e efeitos da seca no Interior


5/11/2010 
A notícia de que prefeituras cearenses podem ter problemas para pagar o 13º salário do servidores neste ano, manchete do Diário do Nordeste, edição de ontem, repercutiu na Assembleia Legislativa. Muitos parlamentares criticaram o fato de vários municípios cearenses dependerem dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e, por isso, estarem sempre de "pires na mão".

O deputado Fernando Hugo (PSDB) foi o primeiro a levar essa problemática à tribuna da Assembleia. Segundo o tucano, as prefeituras do Ceará não têm uma boa arrecadação e sofrem não apenas com o pagamento da folha de pessoal, mas também com a manutenção e custeio das instituições municipais que fazem o serviço público.

Por conta disso, Fernando Hugo atesta que grande parte das prefeituras cearenses depende do que é repassado pelo Governo Federal através do FPM. "Esse é o problema de todas as prefeituras, em especial as de pequeno porte. Não é problema recorrente de final de ano, mas do dia a dia", define.

Ele garante que muitos municípios não dispõem sequer de recursos para a compra de material de higiene para o setor da saúde, o que para ele, pode levar a população a pensar que a administração é falha e o prefeito é desonesto. Na sua opinião, uma saída seria a reforma tributária garantindo aos municípios uma fatia maior na distribuição dos recursos.

O deputado João Ananias (PC do B) concorda com o tucano. Ele avalia que a distribuição tributária existente hoje no País é cruel para os municípios, pois centraliza os recursos na União. Já o deputado Artur Bruno (PT) acredita que faltou às prefeituras fazerem "o dever de casa", se referindo a uma arrecadação falha dos impostos municipais como o ISS e IPTU. Ele também condena o excesso de gastos com terceirizados e supérfluos.

Seca

O deputado Ely Aguiar (PSDC) alertou que a dificuldade financeira de alguns municípios pode se tornar mais grave com a seca que se instalou no Estado e que já está deixando500 mil cearenses sem água, como ressaltou outra matéria publicada pelo Diário do Nordeste, ontem. 

O deputado ressaltou a decisão do governador Cid Gomes em decretar estado de calamidade em 79 municípios. "O clima é de inquietação em cidades como Canindé, Quixadá e Assaré. Essas cidades vivem única e exclusivamente da agricultura, se a chuva não vier fica difícil".

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Seca e Incêndios no Semiárido

PERDAS NA AGRICULTURA (24/8/2010)

Incêndio provoca prejuízo de R$ 100 mil no Cariri

24/8/2010 Clique para Ampliar
Incêndio destruiu 30 hectares de cana e banana de 12 pequenos proprietários rurais do Sítio Riacho Seco, localizado no Município de Missão Velha 
ANTÔNIO VICELMO
No Ceará, já são mais de 200 focos de incêndios registrados pelo INPE, de janeiro até esta primeira quinzena


Missão Velha. Um incêndio destruiu 30 hectares de cana e banana de 12 pequenos proprietários rurais do Sítio Riacho Seco, neste Município. O prejuízo gira em torno de R$ 100 mil. Com dívidas a pagar junto à rede bancária, os proprietários estão "com as mãos na cabeça", sem condições de pagar os compromissos assumidos. Até os cortadores de cana, que dependem do pagamento semanal, não receberam nenhum tostão. A situação é de desespero para os agricultores que enfrentam mais um ano de seca.


Os moradores do sítio desconhecem a origem do fogo que ocorreu, na semana passada. Os proprietários rurais só se deram conta do tamanho dos prejuízos ontem. Eles imaginavam que, mesmo queimada, a cana seria aproveitada pelos engenhos. Depois de percorrer todos os engenhos que estão moendo na região, o agricultor Francisco Gonçalves Barros, conhecido como "Tico" Barros, voltou para casa desiludido. "Eles não querem a cana queimada nem de graça". Foi esta a resposta trazida por "Tico" para seus companheiros, vítimas do incêndio. Ele diz que perdeu a esperança e a paciência. Entrou em depressão e faz três noites que não dorme, pensando numa forma de pagar as dívidas. Até mesmo o plantio de banana, que era utilizado no consumo doméstico e vendido no mercado regional, foi consumido pelo fogo.

O pequeno produtor José Alves Barros, conhecido por "Dedé", que já estava em situação crítica por causa da seca, conta que "aqui, nós perdemos tudo, a única fonte de renda seria a venda da cana. Com este incêndio, a gente não tem como pagar as contas". Ele diz a maior vergonha que sente é não poder honrar os seus compromissos, principalmente junto àqueles "que nos ajudam na luta diária".

O lamento de Dedé é acompanhado pelo cortador de cana Damião da Silva que afirma: "o fogo consumiu o nosso suor. Eu não recebi o dinheiro do meu trabalho. A gente não tem o que fazer porque o prejuízo dos proprietários são maiores. A dor dos outros ameniza a da gente", diz resignado.

Um hectare de cana produz cerca de 90 toneladas, cerca de 30 toneladas por tarefa. A tonelada estava sendo vendida a R$ 40,00. A outra fonte de renda era transformar a cana em pasto para o gado, a fim de suprir a falta de capim, por conta da seca. O agropecuarista Maximiano Ximenes diz que estava comprando o hectare do insumo para pasto a R$ 1.200,00. Agora, com a matéria-prima queimada, ele não quer nem de graça.

Os produtores dizem não ter condições de aproveitar nem a "soca" da cana. "Vamos ter que plantar tudo novamente, sem nenhum tostão no bolso", lamenta. Normalmente, depois de cortada, a soca, ou caule, é mantida no solo, sem necessidade do replantio. Com o acúmulo de prejuízos, maioria está desiludida com a agricultura. "Quando não é a seca, é o fogo. Parece que atrás do pobre corre um bicho", diz o líder sindical Expedito Guedes, presidente do Sindicato dos Produtores Orgânicos do Cariri.


Focos de calor


O número de focos de calor no Brasil cresce de forma assustadora neste mês de agosto. Desde o início do ano, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) já registrou um total de 33.181 focos. Desses, 9.168 (28%) ocorreram em Mato Grosso. Em seguida, aparecem Tocantins (16%), Pará (13%), Bahia (7%) e Goiás (6%). O período de seca e a expansão rural são os principais responsáveis pelo aumento no número de focos de incêndio registrados neste mês em todo País.

De acordo com o INPE, 2010 é um ano muito mais seco do que 2009, com temperaturas mais altas, umidade relativa do ar mais baixa e sem chuvas, o que facilita o uso e a propagação do fogo. Além da questão climática, o aumento expressivo dos focos de queimadas se deve ao crescimento do setor agropecuário, que usa fogo para abrir pastagem e limpar a terra para o cultivo. "Um simples fogo de monturo, pode gerar um grande incêndio", adverte o chefe do escritório do Instituto Chico Mendes, Willian Brito, acrescentando que, no momento, a umidade relativa do ar gira em torno de 23%.

No Ceará, foram registrados 248 focos de calor de janeiro até 22 de agosto. Nestes últimos cinco dias, de sexta-feira até ontem foram identificados 35 focos de calor. Ao fornecer a informação, o coordenador estadual do Prevfogo, Kurtis François Teixeira, esclarece que o satélite só consegue detectar os focos de calor. Os incêndios que ocorrem normalmente no mato rasteiro dentro das florestas não são identificados pelo sensor do satélite. O acompanhamento desses incêndios, segundo Kurtis, deve ser feito pelos órgãos ambientais de cada região.

O coordenador estadual do Prevfogo orienta que, em caso de incêndios ou focos de calor, os proprietários rurais devem registrar um Boletim de Ocorrência no Corpo de Bombeiros, solicitar a perícia junto aos órgãos ambientais, ou telefonar para o 0800-618080 e fornecer informações sobre a propriedade atingida.

Kurtis anunciou que, a partir de setembro, serão deslocados 60 homens do Prevfogo para pontos estratégicos do Interior. 15 deles ficarão baseados em Crato. O Prevfogo é ligado ao Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).


Antônio Vicelmo
Repórter



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O que fazer?



"Eu perdi o trabalho, a paciência e, também, a esperança. Não sei o que fazer para conseguir pagar as dívidas"

Francisco Gonçalves de Barro

Agricultor


"A maior vergonha para o homem do campo é não poder honrar os seus compromissos. Quero pagar as dívidas"

José Alves de Barro

Agricultor


"Agente não tem o que fazer. A dor dos outros ameniza a da gente. Os prejuízos dos proprietários são maiores aqui"

Damião Silva

Cortador de cana


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Praça Joaquim Fernandes Teles, S/N
Crato - Ceará
(88) 3521.5138